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sexta-feira, 30 de outubro de 2009

A noite que não acabou: leitura obrigatória

Nesta sexta-feira (30), teve início a Feira do Livro de Pelotas. Sempre marcada pela diversidade cultural e o bom gosto nas apresentações artísticas, este ano não deve ser diferente. Valorizar a cultura local é imprescindível, o que nem sempre ocorre em nossa cidade.

Infelizmente ainda reina, por aqui, uma mentalidade atrasada e provinciana, capaz de valorizar mais "os de fora" do que "os daqui". Pior ainda são aqueles que se dizem progressistas, mas, no fundo, têm o espírito tomado por esta prática preconceituosa e excludente. Deixando transparecê-la, mais cedo ou mais tarde, sobretudo quando sentem-se acuados pelo talento dos outros.

E, falando em produção local, acredito que um dos destaques da Feira do Livro deste ano seja o lançamento de "A noite que não acabou". Publicado pela Editora Mundial, a obra contém 300 páginas e conta a história do acidente ocorrido com a delegação do Grêmio Esportivo Brasil, no início deste ano. No acidente, morreram o preparador de goleiros Giovani Guimarães e os jogadores: Régis Gouveia e Cláudio Milar, este último o maior ídolo da história recente do clube.

Os autores da obra sempre acompanharam de perto a trajetória do Xavante. Nauro Júnior (fotógrafo do jornal Zero Hora) e Eduardo Cecconi (jornalista do ClicK-RBS) vêm esclarecendo para a imprensa, desde o início da apresentação da obra, que o objetivo não foi escrever uma história sensacionalista e sim, utilizar os recursos propostos pelo jornalismo literário para construir um livro-reportagem, documentando toda a caminhada do Xavante desde o dia 15 de janeiro até a queda para a segunda divisão do Campeonato Gaúcho. Tarefa nada fácil, uma vez que os autores tinham relações pessoais de amizade com as vítimas.

Confesso que ainda me causa muita tristeza lembrar o dia da tragédia. Para mim, que torço para o Brasil desde que me conheço por gente e tenho neste clube minha única paixão futebolística, tudo que o envolva acaba emocionando. Com certeza lerei o livro. Pode até não ser uma tarefa das mais fáceis, mas acredito que trata-se de um registro histórico do que ocorreu e serve não só para documentar esta etapa triste da vida do clube, como também para mostrar o quão frágeis nós somos e, portanto, a importância de se fazer o melhor enquanto estivermos por aqui.

O lançamento acontece neste sábado (31), às 18hs, na Praça Coronel Pedro Osório. Em Porto Alegre a obra será lançada na próxima quarta-feira, dia 4 de novembro, às 17h30min, na Praça da Alfândega.

Onde a flecha pode chegar?

Numa realidade social em que os "fenômenos" são criados com a mesma facilidade com que viram piadas, ter seus próprios ídolos, fora deste circuito, é um exercício de cidadania e independência.

Não acredito na real identificação dos torcedores que dizem ter uma relação de respeito pelo seu "ídolo", mas nunca estiveram perto dele. A proximidade se dá porque ele está na mídia, ou, porque deu para a torcida mais um título "fictício", já que os únicos a lucrarem com tais conquistas são dirigentes e patrocinadores. Também nunca vi torcedor com troféu de campeão mundial em casa e nem medalha no peito. No máximo um pôster ou uma camiseta, onde o cara que assinou o seu autógrafo, hoje, joga no time adversário, beija aquele distintivo e manda a torcida se f....

O interior resiste: uma paixão construída tijolo por tijolo

Mesmo com as relações sociais cada vez mais mercantilizadas, em qualquer área de atuação humana, acredito na importância de se valorizar os que têm uma energia inequívoca e resistem ao habitual. Fazem de chuteiras troféus e transformam gritos de guerra em oração. Acredito num tipo de força que só vem das massas. É um rojão que estoura, um batuque que incendeia, um grito em forma de coro para defender sua crença. Uma esperança renovada a cada momento, de conquistas quase impossíveis, assim como é a nossa própria batalha do dia-a-dia.

Um sentimento singular, que, aos domingos, encontra o coletivo e, mesmo quando todos se tornam cientes da discrepância financeira, da má distribuição de renda, que atinge até mesmo o futebol, não transforma-se em desânimo. Ao contrário, torna-se resistente. Faz dessa afronta financeira motivo para a criação de gritos de guerra. Motivo para defender a sua própria condição e mudar o seu destino. Para tornar-se vencedor e ser verdadeiramente campeão.

Acredito também na perseverança, no brio e na garra de toda gente humilde e batalhadora que desce a rua Princesa Isabel com o coração explodindo de alegria. Esse povo não está indo ver uma partida de futebol, se dirige à sua verdadeira casa. Um templo sagrado para os religiosos, um campo de batalha para os guerreiros, uma escola de vida para todos nós.

Nossa casa conhecemos muito bem. Não é tão grande como aquelas que mostram na TV, não é tão bonita e nem ostenta tantas "taças" como a maioria das mansões que sediam grandes eventos, mas, pelo menos, fomos nós mesmos que a construímos, tijolo por tijolo, degrau por degrau. Lá é possível se deparar com histórias impressionantes. Não só dos feitos de um time do interior e suas conquistas, mas de seus co-arquitetos, aqueles que construíram os cômodos de sua própria morada e, por isso, exigem respeito dos visitantes. É o Brasil de Pelotas, equipe que venceu a Seleção Uruguaia, campeã mundial na década de 1950; que chegou a terceira posição do Campeonato Nacional, em 1985 e que tem, em cada rosto desconhecido, rubro de emoção e negro de sua gente, uma história de vida surpreendente.

Na Baixada, no caldeirão, na nossa casa, já entramos em polvorosa, mas também ficamos em silêncio. Já brigamos por amor e sofremos pela perda. Já xingamos de raiva e calamos por respeito. Já nos sentimos envergonhados pelo vexame e orgulhosos pelo exemplo. Já mandamos alguém embora, mas choramos quando partiram. Já saímos irritados, prometemos nunca mais voltar, mas estamos sempre lá. Porque é naquele espaço que encontramos o nosso melhor.

Somos Xavantes, não temos nada para provar a ninguém e perpetuamos esse sentimento geração por geração. Não estamos buscando as "taças" do vizinho, nem nos preocupamos com os ornamentos que cada um utiliza para enfeitar a sua casa. Estamos ali porque a cada gol saímos vitoriosos e, a cada vitória, sabemos que atingimos o nosso objetivo. É na derrota que mostramos como somos grandes e na vitória que experimentamos onde podemos e, com certeza, iremos chegar. Mais uma vez juntos, tijolo por tijolo, degrau por degrau...

Depois que os negrinhos da estação entrarem e encherem o lugar de alegria, ninguém mais conseguirá tirá-los de lá!

Força Xavante!

"Para a vida inteira eu sou, sou rubro-negro, sou da Baixada eu sou Xavante eu sou"

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